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4h: A Doentia Psique de Rorschach

Atualizado: 28 de fev. de 2020


Metade do tempo já se passou, e cada vez mais Watchmen surpreende ao parecer tão destoante entre suas próprias histórias. Após explorar bastante as semelhanças e diferenças entre a moral questionável do Comediante em face da falta de empatia do Dr. Manhattan, chegamos a um ponto de perfeita simetria. De um lado, Rorschach, aquele que nos leva a esta história desde o primeiro momento. Um detetive do submundo, repleto de mistérios e traumas. Do outro, Adrian Veidt. Um coadjuvante ainda sem muitas informações, mas cujo nome e marca aparecem constantemente escondidos pela cidade.


Sendo um momento mais técnico, este capítulo dos quadrinhos é uma obra de arte a parte, mostrando a genialidade de Moore e Gibbons ao espelhar perfeitamente suas 28 páginas quadro a quadro em uma simetria perfeita. Mas no quesito de história a ser analisada de fato, talvez seja melhor avançarmos um pouco mais.

Rorschach, em suas constantes visitas ao apartamento de Moloch, acaba caindo em uma armadilha e sendo preso. Aqui, iniciamos mais um grande estudo de personagem que vem nos sendo presenteado nos capítulos pares, após entrarmos na cabeça do Dr. Manhattan e Comediante.


Na prisão, acompanhamos não mais os diários de Rorschach mas as análises de seu psiquiatra, que pretende fazer grande nome ao curar o grande maníaco das ruas. Com sessões constantes e diárias e uma viagem pelo passado do vigilante, temos em mãos o histórico do provável personagem mais querido dessa saga.


Para entender Rorschach (um pouco fora das páginas) temos que voltar ao grande Steve Ditko e os anos 60. Em uma época de maior liberdade, o co-criador do homem aranha concebeu o detetive Questão, que acabou ganhando grande fama na animação Liga da Justiça. O homem sem rosto ou expressões gerava histórias mais adultas e filosóficas no início da DC Comics.


Com a inserção do CCA (código de autocensura citado na primeira parte deste especial de textos), Ditko criou um novo detetive, conhecido como Mr. A, um homem incorruptível que se vestia completamente de branco e combatia o crime com luvas de metal e uma máscara de aço. O fato é que Mr. A era um personagem que enxergava o mundo em uma grande dicotomia, onde preto e branco, bem e mal eram coisas completamente opostas, sem zonas de cinza ou meio termos.


Enfim, foi baseado em uma paródia de Mr. A que Alan Moore decidiu criar Rorschach. Um reacionário misógino e mentalmente perturbado, acaba agradando fãs por diversos motivos, como uma versão sombria de alguns aspectos do Batman. Suas noções de certo e errado são tão dicotômicas quanto as de Mr. A, refletidas em sua máscara onde preto e branco dançam sem nunca mesclarem em tons de cinza.

Vemos neste ponto o rosto por traz de Rorschach. Walter Kovacs, o personagem que constantemente vimos andando pelas ruas com placas anunciando o apocalipse, acaba sendo submetido ao teste que carrega seu pseudônimo de vigilante. Assim como alguns heróis (Batman, por exemplo) Kovacs acredita ter se tornado de fato Rorschach, e não apenas usá-lo como uma fantasia. O pano que cobre sua pele tornou-se seu rosto, e as condutas morais de um vigilante noturno sobrepõem sua humanidade.


A citação que Moore escolhe para descrever Rorschach (“Não lute contra monstros, para que não se torne um monstro, e se você olhar para o abismo, o abismo também olhará para você” de Nietzsche), define bem o ponto de virada na vida do personagem. Assim como o mesmo autor aprofundou ao contar a história do palhaço do crime, Coringa, um dia ruim pode servir de um grande gatilho para a criação de uma personalidade mais distópica que dome as noções comuns de realidade.


O histórico de infância e adolescência de Rorschach segue como uma das mais cruas, reais e viscerais origens de personagens, o que provavelmente auxilie na identificação do público com o mesmo. Mas ele ainda tem um crime para resolver. E como ele mesmo disse, não é ele que está preso com ele, mas eles é que estão presos com o Rorschach. E isso não durará muito tempo.

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