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3h: Entre Radioatividades e Relatividades

Atualizado: 28 de fev. de 2020

"FALLOUT SHELTER" (aviso de precipitação) e um símbolo de radiação. É com isto que nos deparamos logo no início do terceiro capítulo de Watchmen. Nos afastando dele, somos a um vendedor de jornal e um menino leitor de quadrinhos, que permeiam os grandes acontecimentos que vamos acompanhando, enquanto nos contam em paralelo a história do gibi “Os Contos do Cargueiro Negro”. Mas para este, teremos um texto à parte.


Voltando aos protagonistas, a história avança em um aprofundamento na relação de Laurie e Dr. Manhattan. Ao contrário do romance utópico entre Lois Lane e Clark Kent, a relação da antiga Spectral com seu “Superman” passa por grandes problemas de distanciamento de bizarros usos de seus poderes. Este triângulo amoroso consegue trazer ainda mais atenção ao temperamento falho dos nossos heróis, com o desprendimento social de relações, subjugadas por desejos.


De um lado, Laurie e Dan são abordados por uma série de ladrões em um beco escuro a caminho da casa de Hollis Mason. Utilizando das habilidades que haviam desenvolvido em seus dias de vigilante, os dois se livram facilmente dos delinquentes em uma grande dança de socos e chutes com alusões sexuais ao prazer que ambos sentem em voltar à ativa.


Do outro, o Doutor Manhattan é acusado de ter causado câncer em três pessoas que mantiveram constante contato com sua presença, provavelmente pela radiação expelida de seu corpo, ou sendo apenas uma grande fake news. A segunda hipótese é aflorada com a escolha de Moore em chamar o jornal de Nova Espress, v em homenagem à um romance homônimo de 1964 sobre o conceito de controle e seu molde pela linguagem. Em Watchmen, este jornal ao anunciar o câncer de Janey Slater, controla a sociedade por um meio de linguagem.


Ainda no nome de empresas, Dan constantemente contrata a Gordian Knot Lock para refazer sua fechadura, em possível alusão ao caso onde Alexandre o Grande, ao se deparar com a carroça de Gordius (pai do rei Midas), não titubeou ao cortar o complexo nó que a guardava, assim como Rorschach faz com as fechaduras. Por fim, Dan e Laurie passam em frente ao cinema Utopia, onde está em cartaz o filme This Island Earth, onde um alienígena decide ajudar a humanidade de não ser destruída. Uma grande alusão à história que nos está sendo contada.


Após todo este grande caminho de preparação, alusões e referências, Moore e Gibbons finalmente se encontram de vez no grande momento divisor de águas da história. Pode-se dizer que o mesmo tem início logo na citação final do capítulo anterior, onde em uma passagem bíblica do livro Gênesis,Abraão implora que Deus não destrua Sodoma e Gomorra. Esta passagem não somente deixa explícita a comparação de Manhattan com Deus, mas explora como ele acreditava estar fazendo tudo certo para a humanidade, até descobrir que poderia nos estar matando, assim como Deus ao recuar na decisão de destruir as cidades pecadoras.


Com isto, nos encontramos com Manhattan em sua decisão de deixar a terra e a humanidade para morar em Marte. Com um grande monólogo niilista de questões existenciais e uso de conceitos relativistas do tempo, este momento pode ser o ponto de desistência para alguns, e o ponto máximo que torna Watchmen um clássico para outros.


Entrando com tudo nos dois maiores temas do final da segunda grande guerra, entende-se o motivo de Jon Osterman ter seu pseudônimo em homenagem ao Projeto Manhattan que originou a bomba atômica. Sendo obrigado a deixar de lado suas aspirações de relojoeiro, assim como seu pai, para entrar na carreira de física quântica, Jon acaba sofrendo um grave acidente radioativo que o destruiu em nível subatômico. Com alusões visuais claras aos efeitos causados pela bomba de Hiroshima, vemos seu corpo se esfacelar, até ser remontado aos poucos em nível atômico, parte a parte, como se monta um relógio.

Não apenas sua origem e aspecto radioativo remetem a estes temas, mas vemos Manhattan já estabelecido como herói escolhendo o símbolo de hidrogênio como seu símbolo, sendo assim a mais devastadora das bombas.


A outra grande questão na história de Jon se devem aos conceitos de Albert Einstein sobre a relatividade. O tempo em passado, presente e futuro são coexistentes e paralelos, doravante dos aspectos de recepção da luz. Estes conceitos astrofísicos são levados para contar uma simples origem de super-herói de forma orgânica e facilmente entendível.


A vida de Jon se divide entre seu relacionamento com Janey (sua primeira namorada) e Laurie (a segunda espectral), onde mesmo o herói de maior sabedoria e aparentemente moral, mostra-se falho ao deixar sua amada por uma mais nova e cheia de vida. Isso mostra uma alfineta de Moore aos leitores que constantemente abandonam as histórias e conceitos antigos por novos, ou mesmo pela forma como muitos relacionamentos comuns de fato acabam.


Comparado a Deus e ao Superman, a história do Doutor Manhattan transpassa grandes pensamentos de Nietsche, no que faz a história ter um destaque ímpar em seu meio. Apesar de alheio à trama principal, onde a história não tem grande avanço, a origem de Manhattan é uma resposta ao pedido que Alan Moore dobrasse o número de edições de 6 para 12, decidindo assim explorar mais a psique dos personagens.


Apesar de feita apenas para ganhar mais dinheiro, devemos agradecer Len Wein e a DC por edições como esta terem surgido.

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